Preparando a alma

26 de maio de 2009 1 Comentário

No dia em que a nossa viagem pela Bolívia começava a se fazer, recebi a seguinte mensagem:

“A gente acha que vai fazer uma viagem, mas logo é a viagem que te faz, ou te desfaz.” (Nicolas Bouvier)
Achei que havia entendido a frase, mas só fui processá-la três dias depois.
A nossa preparação para a caminhada que se seguiria começou em Mojinete, um pequeno povoado rural a 90 km de Tupiza. A distância soa ingênua, mas quando o assunto é Bolívia qualquer viagem rápida de 90 km se transforma em uma longa travessia de quase seis horas serpenteando altas montanhas altiplânicas.
Saímos de madrugada acompanhados do prefeito da cidade e seu fiel escudeiro e, logo nas primeiras horas da manhã, recebemos a primeira prova do que seria a trajeto:

Mojinete tem 80 habitantes e a chegada de dois “forasteiros” causou uma rara agitação. Os locais ainda ficam paralisados e, ao mesmo tempo, curiosos quando chega algum visitante.
(Em Mojinete, todos se escondem e querem ver, ao mesmo tempo).

Desembarcamos, tímidos, na única rua local e saímos para entender onde estávamos.
Mojinete é rural:

É indígena:

E fica na "Cabezera del Valle":

Todos cumprimentavam (inclusive, levantando o chapéu), queriam saber de onde vínhamos e, desconfiados como autênticos bolivianos, questionavam a nossa visita.
À noite, o prefeito e o corregedor da cidade convocaram uma reunião extraordinária para apresentar-nos e revelar nossa real missão.
(Boliviano gosta mesmo de chamar pelo grito. Essa é a rádio local utilizada para dar recados e fazer convocatórias quando chegam forasteiros, entre outras funções).

A sala foi enchendo, lentamente. Olhares entrecruzados e desconfiados.
O Dezinho anda gastando bem o que já aprendeu nos últimos quatros meses (já soltou até alguns Subjuntivos que nem aluno de avançado se arriscava fazê-lo). Mas por motivos óbvios, fui nomeado a contar para aquela gente o nosso objetivo: cruzar 120 km a pé entre Mojinete e Guadalupe, entre as elevadas montanhas do deserto boliviano.
Se eu tivesse entendido a cara de espanto daquela gente, juro que teria terminado a visita por ali mesmo e teria deixado a empreitada para outra encarnação.
Apresentação feita e guia escolhido. Fomos para o hotel improvisado tentar esperar o dia seguinte.
(Sim, essa é a noite e não tem nenhum truque feito em programas para tratamento de imagens).

PS: A amiga que me mandou, de longe, a explicação para o que viria a acontecer carrega no nome o sobrenome Villas Boas, a nossa versão brasileira de grandes viajantes como Costeau, Levy Strauss e Humboldt. Esses Villas Boas entendem mesmo de viagem.

1 comentários:

Anônimo disse...

Edu, meu, só vc mesmo pra me deixar super emocionada com a lapidar poesia das suas palavras! Vc não tem idéia de como tenho pensado em vcs e nessa viagem incrível, que deve estar sendo uma baita viagem interior tb. E eu tinha certezam que uma hora ou outra, aquela citação iria bater fundo e iria fazer mais sentido do que nunca pra vcs.
Grande beijo.
Villas Boas...

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